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O último dândi

O último dândi


Kaza invade o apartamento-palacete de Fabrizio Rollo, o arquiteto sangue azul que gira o mundo e as décadas atrás do bom e do melhor para a casa brasileira – a dele e a dos outros

 

Por Cynthia Garcia Fotos por Cristian Maldonado Retrato por Christian Cravo

 

O imaginário estético do arquiteto de interiores Fabrizio Rollo é de puro refinamento, habitado por ícones que desenharam a elegância e definiram o que se convencionou chamar de bom gosto. Encabeçando a lista está Yves Saint Laurent, que o dândi paulista conheceu em 2006, em um jantar íntimo no Hotel Costes, Paris. Em 2009, nosso Monsieur Rollo foi um dos happy few a visitar o hôtel particulier do mestre YSL e seu companheiro Pierre Bergé com a exposição do acervo de artes decorativas mais fantástica que a batida do martelo da Christie’s jamais leiloou.

 

 

O allure franco-italiano que Fabrizio imprimiu em seu apartamento de 280 metros quadrados, nos Jardins, também é só para os happy few. É a primeira vez que seu universo é registrado nas páginas de uma revista brasileira – ano passado, a Elle Décor americana documentou a morada.

 

 

No living bem dimensionado, o editor de estilo da encarnação anterior de Casa Vogue bloqueou a vizinhança não com a tradicional cortina, mas com dois pares de biombos, um assinado por Dinucci, anos 1940, e outro, de sua criação. “Adoro tudo aos pares, é o delírio do decorador que busca o equilíbrio perfeito”, revela uma das regras que empresta refinamento às casas de seus clientes. Outros fundamentos de sua cartilha são as “paralelas” dos ambientes e a colocação estratégica de espelhos, como acontece no living. Para o olho não treinado, a efusão de formas, cores e texturas pode até parecer resultante da espontaneidade. Ledo engano. “Aqui, todos os ambientes são espelhados, ou seja, se tenho um sofá nessa parede, reproduzo um outro ambiente de iguais proporções na paralela”, explica. Com isso, ambientes e objetos conversam com seus pares, propagando uma planta decorativa baseada no equilíbrio. Para quem fez arquitetura como ele, na decoração, esse artifício é comparável à proporção áurea, presente na natureza, no corpo humano e no universo.

 

 

Com isso em mente, podemos nos deleitar no décor do living em clima franco-oriental com o movimento Arts and Crafts e toques do homewear por Fabrizio Rollo, sua sofisticada linha de décor para o lar. Um dos sofás é da parisiense Maison Jansen, conhecida por reunir influências tradicionais e exóticas, que tem o selo impresso em outros móveis da casa. “Ela foi representada no Rio, nos anos 1940, por Henrique Liberal, o decorador mais refinado que o Brasil teve no período.” Fazendo pendant com o sofá, a mesa de centro de carvalho,também tem uma bela assinatura, é Jean-Charles Moreaux. O conceito decorativo está tão bem alinhavado que admite contrastes como se vê na poltrona bicolor de Geraldo de Barros revestida com lã bouclé Ralph Lauren, nos abajures chineses de porcelana que provém da residência do conde Oswaldo Lara Leite e nos apliques em gesso em formato de plumas de avestruz, da butique de Perfumes Caron, da Avenue Montaigne. Outra marca de sua plasticidade está na padronagem de leopardo: “As almofadas do living são de veludode linho com padrão leopardo em tecidos originais de Madeleine Castaing, a decoradora francesa mais fabulosa do século 20”.

 

 

No chiaro-scuro do escritório, outro sofá Jansen dessa vez revestido com veludo bege com passamanarias Chacur (“executadas impecavelmente”). Sobre ele, almofadas de Aubusson, motivo leopardo,da coleção homewear de Fabrizio, fazem um jogo elegante com a de linho metalizado, Pierre Frey, e a de seda, Hermès. A banqueta de latão e faux tartaruga, anos 1970, criada pelo decorador Terry Della Stufa, está próxima de uma poltrona revestida de linho, mais uma peça desenhada por Fabrizio. Ela exibe um lenço de seda com as iniciais YSL no encosto, sua homenagem ao maior nome da moda da segunda metade do século 20.

 

 

O dormitório de hóspedes transpira requinte e aconchego. As paredes são forradas com tecido paisley da italiana Rubelli. São Dinuccia mesinha lateral e a cabeceira da cama, coroada com um dossel comme il faût da Maison Jansen com cortinado de tafetá de seda pura, Safira Sedas. Na parede, lenços Christian Dior vintage estão emoldurado sem caixas de acrílico e ainda há duas gravuras florais Meissen. As luminárias de latão são argentinas, anos 1960, encimadas por cúpulas de tecido ikat de Georges Le Manach. O console e o espelho são italianos, século 19: “O espelho tem doratura a mecca, que confere um dourado à folha de prata”. O toque moderno nesse quarto europeu com charme oriental está na cadeira Charles Eames, versão bicolor, customizada por Fabrizio para Artesian.

 

 

A intimidade do azul Lanvin do quarto de vestir abriga um console francês e cachepôs chineses de laca, onde guarda sua coleção de perfumes. Nas paredes, para proteção do moço, uma coleção de cães de Fô chineses com o característico azul, gravuras de soldadinhos e aquarelas de trajes militares. No quarto de monsieur, as paredes são em azul polvere: “Bem clarinho, levemente acinzentado, como o azul Lanvin do vestir, minhas cores prediletas!”. A cabeceira art déco, revestida de pergaminho, é ladeada por apliques de parede, Gilbert Poillerat. A cortina de tafetá listrada bege e azul acinzentado é outra criação de Fabrizio para Safira Sedas. A delicada escrivaninha espelhada é outro Jansen por Henrique Liberal e, nas paredes, as gravuras do século 18 são clássicas e masculinas. Ainda há um petit sofá que pertenceu a madame Castaing, ao lado de uma mesa de apoio chinesa, século 19, e, ladeando a cama, um par de peles de leopardo cortado no formato longitudinal de passadeira arrematam o visual da master bedroom que poderia bem ser cenário do clássico de Visconti, Il gattopardo (1963).

 

 

De onde vem todo esse bom gosto? Desde bambino em Tupã, no interior de São Paulo, Fabrizio sabia que seus horizontes seriam bem maiores e ligados ao beau monde. Atualmente, além dos interiores que assina, seu olhar para a elegância, que até a veia de sangue azul tem, dá consultas de estilo à revista Harper’s Bazaar. Antes, foi editor da Homem Vogue e autor de antológicas produções da Casa Vogue, quando as duas publicações estavam sob a franquia da Carta Editorial. Mas ele não parou aí, seu estilo furou o cerco da Vogue Itália onde imprimiu seu requinte nas páginas da concorridíssima revista. Como se não bastasse, é um dos personagens mais fotografados na bíblia contemporânea do estilo, o site The Sartorialist. Mais racée que isso?

 

 

Fabrizio Rollo por Walcyr Carrasco “O Fabrizio é divertido e criativo. Já o conhecia há muito tempo, mas o relacionamento ficou mais próximo recentemente, porque brigamos pelo mesmo móvel. Vi o sofá dos meus sonhos num antiquário. Quando quis comprar, soube que estava reservado para o Fabrizio. Pedi para me repassar. Ele foi superlegal, mas explicou que já estava incorporado no projeto de uma cliente. Quase entrei em coma de decepção! Dias depois,ele me mandou um email: havia encontrado um outro sofá, ainda mais interessante. Foi comigo a esse outro endereço e realmente era lindo. Fiquei com ele. Pouco mais tarde, comprei o novo número da revista Veranda. E um sofá absolutamente idêntico ao que eu havia comprado estava na capa. Foi uma prova do seu bom gosto. E eu fiquei feliz porque além de um bom profissional, o Fabrizo mostrou que sabe ser amigo e sempre muito gentil.”

 

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